6 de jun. de 2009

O VÔO 447


A Air France soube do trágico destino dos ocupantes do vôo 447 às 23:10, quando uma mensagem automática acusou a falha no controle de limitação do curso do leme.

Quando menos de 24 horas depois do vôo ser oficialmente dado como desaparecido Sarkozy apareceu na tv com aquele pronunciamento funestro nós, os sempre otimistas, junto com nosso presidente, nos aferramos à esperança - afinal, Deus é brasileiro, né?

Eles sabiam. Como sabiam que ainda antes de deixar a área de controle do Rio, a aeronave já enviara 24 sinais de anomalias em seus sistemas de bordo.

Foram 24 avisos, gente.

Imagine que você está em seu carro. Tudo bem, ele recém passou por uma revisão e você pega a estrada e, vamos dizer, está seguindo para a Transpantaneira. Você sabe que passadas as últimas pousadas o que o espera são centenas de quilômetros inóspitos sem nenhum bar de beira de estrada ou oficina onde possa buscar socorro. Pra piorar, viu pela tevê que a meteorologia prevê uma forte tempestade bem no meio do caminho. Você vai seguindo, atento ao céu e à paisagem, e já está passando o limite da última grande pousada que avistara à beira da estrada. Aí 24 coisas estranhas acontecem no seu painel de controle incluindo a direção e o odômetro.

O que você faz?

Leio hoje na Folha que às 23:10 de domingo uma mensagem informa que o leme quebrou. A aeronave voava a 840Km/h numa altura de 10,7 quilômetros. Este foi um dos 24 avisos e, estranhamente, só agora parece que as autoridades da França se debruçam sobre esse "pequeno" detalhe. Ao que parece, estavam mais interessadas nas incongruências entre leituras de velocidade e altitude, estranhamente mais relevantes que a quebra do leme.

O que isso me diz? Que a Air France sabia que o vôo 447 jamais entraria no espaço aéreo do Senegal.

Poderia ter intervido?

Poderia ter ordenado ao piloto que se dirigisse ao aeroporto mais próximo ao primeiro sinal de anomalia, mas não o fez. Como não o fez ao segundo, ao terceiro, e por aí vai...

Poderia ao menos ter alertado o controle de terra brasileiro que tinha uma aeronave sua no ar com problemas, mas não o fez - e nisso colocou em risco todo o tráfego aéreo na região.

No que a Air France foi rápida e eficiente foi no tratamento às famílias das vítimas, só divulgando a lista de passageiros mais de 72 horas depois de o vôo ser dado como desaparecido e assim garantindo ser a primeira a contactá-las, tratando de coletar o maior número possível de familiares e colocá-los em isolamento, num ambiente controlado - por ela, Air France -, para "protegê-los" do assédio da mídia, é claro.

Não é do interesse da Air France que as famílias retornem ao convívio social, compartilhando sua experiência com pessoas que não estão vivenciando diretamente o trauma. É interesse da Air France reuni-las num rebanho de fragilizados "acompanhados" por seus especialistas, empenhados em aplicar lentes cor-de-rosa sobre qualquer visão crítica que qualquer familiar porventura venha a ter em relação às reais intenções e ações da Air France.

Ou você não reparou que ainda antes que equipes francesas se juntassem aos esforços de busca e resgate, uma equipe de "especialistas" franceses já desembarcara no Rio para "apoiar" as famílias?

Isso é uma técnica, é sistemático e tem nome: fall out control.

Mais: ontem a Air France pediu a intervenção da OAB/RJ contra advogados que estariam supostamente assediando os familiares.

Não é interesse da Air France que essas pessoas contactem advogados próprios, que discutam o ocorrido com a sociedade, que exponham e busquem respostas alternativas às suas dúvidas e questionamentos.

Não é interesse da Air France que 228 advogados diferentes entrem com 228 processos diferentes nas mais diversas cortes e instâncias, pior, que esse pequeno exército vasculhe seus registros e arquivos munido de ordens judiciais que forcem à abertura de suas caixas pretas, expondo falhas cruciais em seus procedimentos de segurança já em terra.

Não é do interesse da Air France que os destroços do vôo 477 jamais sejam encontrados, particularmente as duas caixas-pretas - ou por que outro motivo será que desde o primeiro momento os franceses têm insistido na dificuldade dessa localização? É um conceito manjado da teoria da comunicação que a redundância reforça e aprofunda qualquer conceito, por mais absurdo que pareça à avaliação crítica mais superficial.

Aliás, onde é que estão as equipes francesas e norteamericanas enviadas para ajudar nas buscas? Onde está o tal submarino todo bam-bam-bam que pode identificar até o sexo duma medusa a mais de mil metros de profundidade? Onde está todo o aparato tecnológico de primeiro-mundo de que eles dispõem? Nas notícias, só se vê soldado brasileiro voando e voando, barco brasileiro navegando e as buscas seguem a olho, e, pior, provavelmente no lugar errado, porque a Air France teria hipoteticamente condições de fornecer coordenadas mais exatas com base em suas próprias leituras, mas aparentemente, não o fez. Ou será que não?

Não sou adepta da teoria da conspiração, mas a coisa aí tá fedendo.

Tudo que eu sei é que é do interesse da Air France que as buscas prossigam pelo maior período de tempo possível, com o maior número possível de contradições e informações equivocadas; e que nesse meio-tempo, as famílias continuem envolvidas no processo, que continuem sitiadas em hotéis sob sua vigilância e isoladas da sociedade por tanto tempo que, quando finalmente retornarem à sociedade, se mostrarão gratas aos cuidados e atenção dispensados pela Air France, e mais propensas a fecharem acordos pífios em troca de um pouco de normalidade.

Todos os esforços que foram poupados em evitar esta tragédia estão sendo agora dispendidos em controlar seus efeitos financeiros. Porque, não tenha dúvidas: tudo se resume a dinheiro.

Às centenas de pessoas vítimas dessa tragédia, meus sinceros votos de paz e luz na eternidade.

Às famílias, meus pêsames e votos de paz e luz para prosseguirem com suas vidas concentrados nas lembranças felizes dos entes que faleceram.

À Air France meus pêsames pela hipocrisia e a firme decisão da jamais embarcar em um vôo seu - que, por sinal, custa 3 vezes mais que na maioria das demais companhias.

E tenho o dito.

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