13 de mai. de 2008

CODENOME: JOLANTA



Quem olha a foto acima vê uma velhinha sapeca, com aquele sorriso de quem dançou e bebeu a noite toda, contrariando as ordens médicas.

Ou será que ela está faceira pela quantidade de pessoas implorando detalhes de sua super-secreta receita de cozido?

Não. Nada disso. A vovó aí em cima está explodindo de alegria, porque por sua iniciativa duas mil e quinhentas vidas foram salvas. Isso mesmo: DUAS MIL E QUINHENTAS. Pelo menos.

Filha de um médico socialista (coincidência?), para Irena Sendler ajudar os pobres e necessitados não era nenhum ato de bravura ou despreendimento, mas simplesmente o que se tem que fazer.

Era 1939 e a Polônia cedia à máquina nazista. Os judeus eram execrados e privados de suas posses e lançados às ruas para mendigar. Como administradora sênior no Departamento de Serviços Sociais, Irena logo identificou nessas cantinas uma possibilidade de ajudar esses milhares de pessoas. Sob sua administração, as cantinas passaram a fornecer além da comida, roupas, remédios e dinheiro. E não ficou por aí: sempre que avisada de uma iminente “inspeção”, a equipe de Irena pretextava terríveis doenças contagiosas e potencialmente letais que afastavam a milícia dos lares judeus.

1942. Era criado o gueto de Varsóvia. As cantinas ficaram vazias e Irena impossibilitada de ajudar. Muitos balançariam a cabeça e se confortariam repetindo “eu fiz o que pude”.

Irena, não. E olhe que ela tinha família, filhos e tudo o mais que usamos como desculpa pra não sair do nosso caminho cotidiano quando nos deparamos com alguma iniquidade.

Valendo-se outra vez de seu posto e qualificações, conseguiu um passe de acesso ao gueto, e com redobrada energia (porque não dizer urgência), arregaçou as mangas: pra simbolizar sua solidariedade com os judeus, envergava a malfadada braçadeira com a estrela de Davi percorrendo as vielas do gueto. Na bolsa, ao invés do batom e rímel carregava documentos falsos com os quais vingou resgatar milhares de crianças daquele horror (desculpe, mas me faltam palavras pra descrever o que foi aquilo), enviadas para lares adotivos e orfanatos por todo o país. Pensando no futuro dessas crianças, na esperança de que um dia pudessem resgatar sua verdadeira história e origens, Irena manteve o registro de cada nome trocado, que anotou em código, em folhas de papel que eram enroladas e enfiadas dentro de garrafas que enterrava no pomar de um vizinho. Desenterradas as garrafas, foram contados 2.500 nomes.

Em 20 de outubro de 1943, Irena foi presa pelos nazistas. Vendo que interrogatórios não bastavam, a Guestapo pegou pesado: Irena teve os pés e pernas quebrados – entre outras agressões - enquanto era repetidamente perguntada sobre o paradeiro das crianças e das pessoas que a ajudavam. De seus lábios nem um nome escapou. Talvez, o nome de Deus, mas esse não fazia parte das investigações já que aparentemente havia abandonado a todos.

Foi salva da execução pela ganância de um oficial que aceitou o suborno oferecido pela resistência polonesa. Passou o resto daqueles anos negros na clandestinidade, fugindo dos cães de caça nazistas.

Depois da guerra, ela desenterrou as garrafas, com a intenção de reunir as 2.500 crianças às suas famílias originais, mas o holocausto não deixara muito a reunir.

Ela foi uma heroína?

EU PODIA TER FEITO MAIS. ESSE REMORSO VAI ME SEGUIR ATÉ A MORTE.

Respondeu ao ser perguntada se se via como tal.

FUI EDUCADA NA CRENÇA DE QUE SE DEVE SALVAR AS PESSOAS, NÃO IMPORTA A RELIGIÃO OU NACIONALIDADE.

Justificou com simplicidade sua dedicação.

CADA CRIANÇA SALVA COM A MINHA AJUDA É UMA RAZÃO PARA MINHA EXISTÊNCIA NA TERRA, E NÃO UM TÍTULO HONORÍFICO.

Ontem perdemos Jolanta. Rezo que em algum lugar deste vasto mar de egoísmo e desprezo pelos dessemelhantes a estrela tenha brilhado e outra Jolanta tenha nascido, pelo bem das crianças na África, Oriente Médio, Oceania, Ásia e Américas.

Um comentário:

  1. Oremos por esse anjo na terra,que subiu ao céu e virou estrela,para iluminar as nossas noites mais escuras!!!
    Beijo,Cris.

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