BOM DIA!!!
É um processo engraçado esse: nossa estréia na escola (seja no primeiro ano ou no pré) é sempre brindada com tintas, cantinhas, lápis, crayons... e dá-lhe pintar no papel, na cartolina, na lixa, no vidro, nas paredes até. Em casa, nossos se mostram orgulhosos e exibem nossas "obras" para familiares, amigos; e, mais recentemente, para o mundo todo pelas redes sociais.
Aí, a medida que a gente vai crescendo, as tintas vão sumindo da classe, até que toda a cor se resuma ao azul das canetas Bic. Se pegos desenhando em sala de aula somos corrigidos, reprimidos, as vezes até ridicularizados. Em casa, se passamos mais tempo ocupados com as tintas ou a música do que com as tarefas da escola, logo vem a reprimenda:
- Você não está levando nada a sério.
E segue a pressão por se buscar uma "profissão", como se arte fosse uma (des)ocupação inconsequente e infantil. E dá-lhe "aconselhamento de carreira" ("career coaching", nestes tempos chiques e modernos): "você precisa pensar no futuro", "não seja imprevidente".
"O trabalho dignifica o homem". Toda a arte é vista como ócio, como vagabundagem de quem não quer crescer e assumir responsabilidades nesta vida.
Em oposição, artista é aquele ser drogado, preguiçoso e estouvado que passa os dias dormindo e as noites se divertindo por aí.
E aos milhões, as cigarras despem-se das asas para virar formigas: o futuro Picasso vira arquiteto. O novo Mozart, engenheiro; e o jovem Hemingway, advogado.
Terno escuro, camisa branca, gravata, sapato engraxado (se for mulher, terninho e saia, camisa branca, meias de nylon e sapatos de salto alto); e lá nos vamos deslizando pelas esteiras de um sistema de valores e obrigações que vão se avolumando e ao mesmo tempo condicionando, tolhendo e forjando nossos caráteres para melhor nos encaixar no estereótipo mais apropriado à função.
Com sorte, alguns encontrarão satisfação na carreira escolhida, e olhando para trás sentir-se-ão felizes e realizados.
Com um pouquinho mais de sorte, chegarão mesmo a ser "bem sucedidos" (status via de regra aferido mais pelo crescimento do patrimônio do que pela qualidade do trabalho realizado) - o que não implica necessariamente em senso de realização e felicidade pessoal.
Boa parte vai ficar pelo caminho batida por um câncer, uma doença cardíaca, hipertensão, diabetes ou algum acidente ou morte violenta.
Muitos sobreviverão às doenças, perigos e aflições para chegar ao "futuro" - o almejado estado de graça livre do stress dos prazos, dos horários, da ansiedade de se estar sempre correndo atrás da máquina.
A imensa maioria chegará cansada, batida, vencida, derrotada; sem energia para mais do que vestir o pijama listrado e assistir a vida passar pela janela viciante da televisão.
Melhor seria terem levado a vida menos a sério, sido menos "previdentes", e vivido um pouco mais. Com menos distração e mais satisfação.
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