26 de abr. de 2014

O TAL DO "PENSAMENTO POSITIVO"


"Pense posivito e o universo responderá."

Este é o mantra da atualidade. A ponto de virar obrigação, e se algo ruim acontece, é sua culpa: você não "mentalizou" de forma suficientemente positiva.

"Dicas" para ser mais positivo e alcançar o "sucesso" seja em que área for, vêm rendendo milhões à indústria da informação e alguns poucos "facilitadores" de plantão.

E, no centro desse bombardeio, estamos nós, meros mortais. Seres falíveis, sujeitos a inseguranças, medos, dúvidas e crises de toda a sorte; angustiados em focar em tudo que move, tudo que muda, tudo que é transitório; presos à ilusão de que projetando pensamentos e energias "positivos" seremos capazes de manipular esses movimentos para que atendam aos nossos anseios. Envolvidos no malabarismo diário de manter no ar todas essas bolas enquanto a vida nos carrega vertiginosamente por rios e montanhas, prestamos mais atenção aos movimentos caóticos de nossas mãos do que ao fantástico cenário a renovar-se constantemente ao nosso redor. E nisso, a cada dia, perdemos mais um pouco da perspectiva sobre nossas próprias vidas.

É muito difícil ser "feliz" e "positivo" quando se vive angustiado tentando controlar pessoas e circunstâncias ao nosso redor.

Ainda mais porque sabemos, lá dentro, lá no fundo; que não temos esse poder. Mas nos falta paciência para esperar que o tempo aja por si: queremos precipitar as coisas, porque a nossa criança está fazendo a maior gritaria dentro de nós. Nossa criança quer. E quer para si, mesmo que isso implique em privar os outros. Nossa criança não se importa com mais ninguém: só ela existe em todo o universo. Logo, o universo TEM QUE DIZER SIM. SEMPRE.

"Pense positivo e o universo responderá" é uma fórmula que SÓ FUNCIONA se o seu pensamento está alinhado com o propósito do universo. E aqui, a má notícia: o propósito do universo não é satisfazer suas vontades, vaidades e pulsões.

O universo tem propósitos próprios e não está nem aí para nós.

Tampouco deuses, anjos, santos ou entidades estão aí para atender nossos caprichos, então, pode "pensar positivo" o quanto você quiser: o universo, seu deus, seus anjos, santos ou entidades seguirão de ouvidos moucos:

Enquanto seu "pensar positivo" seguir sendo a projeção da sua vontade sobre coisas, pessoas ou circunstâncias, você vai seguir vivendo às escuras, envolto no véu da ilusão; sofrendo e se angustiando porque as coisas "não saíram como eu queria".

Esse "pensamento positivo" que lhe venderam é o pensamento mágico, a ilusão de poder que um bebê que sofre quando privado do seio materno exerce sobre o ambiente. Esse "pense positivo e o universo responderá", na verdade empurra você para uma posição de impotência, de fraqueza: você vai lá, mentaliza, energiza, bota toda a sua vontade nisso ou naquilo e... nada! Daí se frustra, se angustia, se deprime e enfraquece mais ainda.

A gente só assume o controle sobre a própria vida quando entende que o único controle que realmente exercemos é a forma como reagimos a esta ou aquela coisa, pessoa ou circunstância.

Não existem fórmulas mágicas para se viver.

Infelizmente, é difícil alcançar esse entendimento sem dor, sem perda - na verdade sem uma grande perda -, sem frustração, sem chegar ao fundo do poço.

Porque é lá, no fundo do poço, quando toda a Luz parece ter lhe abandonado e toda a esperança e propósito se esvaem; que você se vê como realmente é: uma jornada única, solitária por definição, pois os maiores eventos da sua existência (nascimento, iluminação e morte) só podem ser experimentados na solidão. Nem seus pensamentos podem ser compartilhados. Alguns conceitos e ideias, sim; mas esse fluxo constante que nos absorve diariamente e único e solitário por natureza.

E essa solidão não pode ser preenchida por coisa alguma, pessoa alguma, evento ou circunstância alguma. Só você pode preenchê-la com aceitação, compaixão e amor a si mesmo.

"Pensar positivo" não tirou nem NUNCA VAI TIRAR ninguém do fundo do poço: essa é uma força que só emerge dentro de nós quando já estamos no processo de subida.

Abrir mão do controle, restringir toda a ação, toda a palavra ao absolutamente necessário. Essa é a lição a ser aprendida no fundo do poço. Um pouco de distração é bom, mas uma alma ferida não se cura no turbilhão do mundo: só piora. Porque o turbiilhão do mundo é a fogueira das vaidades e das vontades; é a Roda de Samsara, o reino do ego.

E, acredite em mim e em todas as religiões realmente espiritualizadas: o ego não é o melhor amigo da alma, porque ele está mais identificado com a criança e seus quereres e inquietações com tudo que se move e é transitório, do que com o que está calmo ao seu redor, que é do que a alma se ocupa.

Uma alma se cura na calma e no silêncio. É por isso que toda a religião espiritualizada aconselha o recolhimento, aconselha a introspecção; a olhar para dentro pesando e analisando os próprios anseios à luz das nossas crenças e convicções. E nessa análise, reavaliar a ambos com a mesma frieza de um cirurgião. É quando a gente descobre que andava baseando a própria vida em modelos que não nos servem bem, por mais que (aparentemente) sirvam a todos ao nosso redor. Igualmente, concluímos que muitos dos anseios que tanto nos afligem têm bases frágeis, quando não questionáveis: e encontramos satisfação maior em abrir mão deles.

Não tenha medo de fazer essa análise. E, se no processo, descobrir que vinha deixando de lado tudo aquilo que realmente importava para você; reverta essa roda. Sobre isso, você tem controle.

Esse é TODO o controle que você tem na vida: o COMO VIVÊ-LA.

Você não controla o "com quem", o "quando", o "quanto"... mas você tem pleno controle sobre o onde - será que está vivendo no lugar onde se sente melhor?

Você tem controle sobre suas ações, sobre as coisas que faz para prover seu sustento - será que está na profissão certa para você?

Você tem controle sobre suas escolhas, sobre o que priorizar na vida; mesmo que isso implique contrariar a todos ao seu redor. Até porque, cabe a você e só a você escolher como é que vai lidar com essas reações, o quanto vai permitir que interfiram no curso que traçou para si mesmo.

Quando começar a formular essas perguntas, você vai começar a sentir que está se mexendo, levantando e erguendo os braços para começar a subida. A cada resposta, vencerá alguns centímetros.

E não se assuste se cair de volta mesmo depois de ter subido alguns metros. Não se recrimine: somos humanos. Não precisamos nem podemos acertar sempre. Se cair, dê-se um abraço, um chamego. Encontre conforto lembrando que a cada lição aprendida, um erro não voltará a ser cometido.

E confie. Acima de tudo, confie. Seja honesto consigo mesmo, e confie.

Quanto mais honesto você for, quanto mais sincero for o propósito que colocar cada vez que, agarrado às paredes lisas do poço e tremendo de medo de cair, você ousar soltar uma das mãos para alcançar um pouco mais acima arriscando perder o equilíbrio precário que a tanto custo conquistou; mais o universo o apoiará para que avance.

"Pensar positivo", mais que projetar sua vontade de forma infantilizada sobre o mundo, é resgatar de dentro de si a própria verdade e projetá-la sobre sua vida, efetuando as mudanças de que necessita e sobre as quais tem poder de decisão e mudança.

NAMASTÊ!

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