Sei que eu prometi falar sobre essa doença contemporânea de tornar tudo que é feio, mau, assustador fofinho, lindinho, sexy e limpinho, mas hoje eu quero escrever livremente o que me vier à cabeça, sem um tema pré-definido.
Talvez até porque tem muito a ver com essa mesma mania de fazer tudo dourado, sexy e cor-de-rosa que anda por aí; junto com uma outra doença que aflige a sociedade moderna que é o tal "poder da mente", o tal "pensamento positivo", essa ideia mágica e infantilizada de que basta botar uma ideia na cabeça e você vai ter sucesso, ser feliz e, de quebra, ficar podre de rico.
Para a maioria das pessoas que vivem presas à matrix, isso já ganhou força de lei.
E quem não anda por aí se fazendo de bem resolvido, quem tem a honestidade de se expor como realmente é: um ser pensante que tem mais dúvidas que certezas, que se permite momentos de introspecção e melancolia - por que não?; é visto como um derrotado, uma influência ruim gerando campos de energias "negativas". Um leproso energético espalhando sua doença por aí.
Pessoas "bem sucedidas" não têm dúvidas: estão SEMPRE certas! E, se porventura alguma sombra de dúvida arrisca anuviar o horizonte, ela é escorraçada com fórmulas mágicas, distrações e sorrisos forçados.
Como se não bastasse o hipnotismo da mídia, as pessoas andam se auto hipnotizando por aí, como se parar na frente do espelho e repetir "Eu sou feliz! Eu me basto!" fosse a a chave do paraíso.
Nada poderia estar mais longe da verdade.
A "chave do paraíso" - se é que existe tal coisa; é enfrentar os próprios demônios, permitir-se descer aos confins do inferno com a confiança de saber encontrar por sua própria conta e risco o caminho de volta; e renascer das próprias cinzas. É se tornar o "leproso" de quem os pseudo-bem-sucedidos fogem como o diabo da cruz. É se submeter ao isolamento, condição essencial para começar o processo de busca que leva ao discernimento entre o que é de fato a nossa natureza, o que nos foi impresso pelo ambiente em que crescemos e com quem convivemos, e quem sentimos que devemos ou queremos ser.
Isso requer mais coragem do que levantar de manhã, pintar a cara, plantar um sorriso na frente do espelho e sair pra rua vender o próprio peixe. E dá-lhe batom pra tanto sorriso e creme pra tanta ruga de sorriso artificial. (Cá entre nós, fico com as minhas rugas, porque quando eu rio, eu rio com a alma, com todo o corpo e o coração e quero mais é me olhar no espelho e ver essas rugas todas: cada uma delas é a marca de uma grande emoção por que eu passei).
Porque é lá, sozinho no deserto de brasas, sem NINGUÉM para ajudar, que você vai conhecer a medida e a extensão da sua força; sua fibra, sua vontade de viver.
Lá, no calor desse deserto, você encontra a verdade. A SUA verdade, que é única e não interessa a ninguém mais.
E é lá que você ou transcende ou se perde de vez.
Porque o deserto de brasas não é para os desesperados, nem para os fracos de coração.
É a provação do guerreiro: porque é lá, onde toda a esperança fenece que a gente vai buscar lá no fundo da própria alma a sementinha da criação, que não é maior do que um ínfimo grão de areia, e no começo mal dá para iluminar a palma da mão.
O primeiro momento é desolador: então é isso? Isso é TUDO que me restou? É tudo que existe em mim?
Sim.
É tudo: o universo inteiro cabe num grão de areia.
E nesse momento, nesse próprio pensamento, descobrimos que o NOSSO UNIVERSO INTEIRO está contido naquele ínfimo grão de areia.
É quando se começa a sentir o calor nas palmas das mãos e se sabe que neste calor está a cura, porque o grão de areia se expande e contrai com as batidas do nosso coração.
Em algum tempo, ele mais parece uma pérola. Ainda é pequeno, mas apresenta uma forma mais ou menos definida. Podemos pegá-lo entre os dedos, manipulá-lo, observar seus contornos, a luz que cintila. A luz da Paz interior, da certeza de que essa pequena pérola que é todo o nosso universo é tudo de que precisamos para começar a caminhada.
É quando entendemos (finalmente!), a dimensão da nossa imortalidade: pois nosso ego morreu, acabou, jaz no chão como um monte de farrapos que já não nos serve mais. E ainda assim, estamos vivos.
Quando todos esperam que sigamos nos debatendo em dor e negatividade; sorrimos com a alma.
Falamos de coisas que ninguém entende.
Vemos dimensões no mundo como poucos (privilegiados) conseguem ver.
E parecemos loucos aos olhos deles.
Logo nos cobrarão "coerência", "equilíbrio", "sensatez"... RESISTA! Tudo que estão pedindo é que você volte a ser aquele monte de farrapos, porque sua Luz incomoda: os faz cientes dos próprios farrapos - melhor mantê-lo na zona de conforto.
Tenha paciência: eles só estão evitando a dor. Mais cedo ou mais tarde, ela virá, porque vem para todos.
Tenha compaixão: nem todos estarão dispostos a pagar o (alto) preço do crescimento. A maioria ainda assim seguirá presa aos velhos padrões, acrescentando novos farrapos para cobrir as partes que ficarem expostas. Podemos lhes apontar o caminho da Luz, mas não podemos percorrê-lo por eles.
Seja flexível: você não pode se furtar à convivência com nível menos elevado de vibração. Elas são a maioria, então melhor é aceitar o fato e se adaptar.
Evite a crítica: só porque você descobriu a SUA verdade, não quer dizer que ela se aplique a ninguém mais. Ela é sua, e cada um tem livre-arbítrio para descobrir a própria verdade do jeito que melhor lhe convier. Se a sua verdade o levou ao veganismo, não critique quem come carne. Se a sua verdade o levou ao Budismo, não critique quem não segue o Caminho do Meio.
Ter vencido sua provação e alcançado sua própria Luz não faz de você uma pessoa melhor do que os outros; apenas uma pessoa melhor para você mesmo e PARA os outros.
Esta é a MINHA verdade.
É o que aprendi e sigo aprendendo a duras penas desde que a carta da Torre desceu sobre a minha vida pulverizando todas as certezas, hábitos, ilusões e acomodações.
Ainda não estou livre de recaídas, mas sigo andando.
Comecei me arrastando sobre um braseiro, agora já caminho em meus próprios pés.
Ao longo desse percurso me deparei com inúmeras miragens: distrações, soluções fáceis, ilusões de conforto que só serviram para aumentar a dor e o desespero.
Estou aprendendo a identificá-las no ato. Vejo as montanhas ainda ao longe, e é para lá que vou. Para o alto daquela que me chama e que eu sei que é onde mereço e devo estar, porque é lá que encontrarei a minha plenitude: quem eu melhor sou, o que de melhor eu sei fazer, minha razão de viver.
Sim, ainda piso em brasas; mas meus pés já quase não sentem mais sequer o calor.
Por estranho que pareça: está valendo cada minuto, e sou grata à vida por ter me colocado aqui; porque o que estou ganhando é muito, mas infinitamente mais gratificante que um sorriso de batom na frente do espelho seguido de um dia de expectativas frustradas.
Espero por nada: eu é que faço o meu destino. O carrego nas mãos, no calor do grão de areia que orbita e cresce ao meu redor, segundo a minha vontade.
Estou viva, e meu aprendizado faz de mim uma curadora de almas num tempo que nega o espírito e cultua a matéria, o imediato, o superficial.
Este é o meu caminho.
Agora vá buscar o seu. Não posso mostrar o caminho, mas estarei aqui torcendo e ajudando no que puder.
NAMASTÊ!
Nenhum comentário:
Postar um comentário