3 de dez. de 2012

NÃO SE DEIXE LEVAR




No pequeno vilarejo habitado por humanos próximo à Grota do Fundão, morava um menino de 11 anos chamado Pedrinho, que não era nem alto nem baixo, nem magro nem gordo, nem tampouco tinha muitos amigos.

Mas desde os cinco anos de idade, Pedrinho tinha um cão chamado Bóris, com quem adorava brincar. Entre as muitas brincadeiras, jogar bola era a preferida dos dois.

Um dia, brincando à beira do lago, Pedrinho jogou a bolinha com tanta força que ela foi parar dentro d'água. Ao ver Bóris seguindo sem hesitação para dentro das águas traiçoeiras, Pedrinho gritou e chamou, mas Bóris não lhe deu ouvidos e para total assombro do dono, seguiu correndo sobre a superfície da água, pegou a bolinha e trouxe de volta.

Pedrinho voltou a jogar a bola na água várias vezes, reparando maravilhado que Boris realmente conseguia correr sobre a água.

No dia seguinte, na escola, Pedrinho contou o feito a seus colegas, virando imediatamente motivo de chacota geral.

- Mas ele consegue correr sobre a água, sim! - insistia Pedrinho à beira das lágrimas.

- Além de burro, você também é mentiroso! - acusaram os outros meninos.

- Mas eu posso provar que é verdade! - insistiu Pedrinho.

- Então, prove. - desafiou Mané o fortão da turma - E se não for verdade, vou bater em você.

Ficou combinado então que naquela tarde mesmo todos iriam se encontrar no lago para ver o cachorro correr sobre a água.

A turma já esperava a algum tempo, quando Pedrinho finalmente chegou com seu cachorro.

Sem dizer uma palavra, Pedrinho jogou a bola no lago, e Bóris correu para dentro d'água. Calados, os outros meninos alternavam olhares entre a corrida de Bóris e a expressão indecifrável de Mané. E como Mané não mostrava espanto ou surpresa, guardaram para si o que quer que estivessem sentindo.

Com os olhos fixos em Bóris, como se disso dependesse toda a sua vida, Pedrinho não reparou em nada disso, só se voltando para os demais depois de ter a bolinha em suas mãos.

- Então, viu como o meu cachorro é especial? - perguntou Pedrinho ansioso.

- Tudo que eu vi é um cachorro tão inútil que não sabe nem nadar! - retrucou Mané dando as costas com desdém - Vamos embora, turma. Esse Pedrinho é mesmo um idiota.

E lá se foram Mané e os outros meninos. Só João, o garoto esquisito de quem ninguém gostava ficou para trás.

- Puxa, seu cachorro é fantástico! - cumprimentou João acariciando a cabeça de Bóris - Nunca vi nada assim!

Pedrinho nem olhou para João: com o peito apertado observava a turma se perder na distância aos empurrões e gargalhadas.

- É um cachorro idiota! - desabafou finalmente - Passa o dia todo correndo atrás de mim com essa cara de abobado e vive quebrando tudo na casa! Quer? Pode ficar com ele, é tão inútil como você!

- Ele só falou isso por inveja. - João tentou argumentar.

Mas Pedrinho não deu ouvidos: jogou a bolinha com toda a força para dentro do lago e enquanto Bóris corria para buscar, subiu em sua bicicleta, saindo em disparada.

Entristecido, João ficou olhando Bóris correr até o meio do lago, voltando em seguida com a bolinha. Ao ver que seu dono partira, Bóris não hesitou e com a bolinha entre os dentes saiu em disparada seguindo o rastro do dono.

Nos dias que se seguiram, Pedrinho não só não brincou mais com Bóris como passou a espezinhar o pobre animal.

- Pedrinho! Não é assim que se trata um bichinho de estimação! - repreende a mãe zangada ao vê-lo chutar o pobre cão.

- O Bóris não é um bichinho, nem é de estimação! - bradou Pedrinho - Eu odeio ele!

Vendo o cão definhar entristecido, os pais depois de muito conversar decidiram oferecê-lo para doação. Afixaram alguns cartazes na vizinhança e esperaram o resultado.

No dia seguinte, ninguém menos do que Mané e seu pai batem à porta da casa com um dos cartazes nas mãos.

Da janela de seu quarto, Pedrinho observou rancoroso quando Mané se afastou levando Bóris todo faceiro.

Na semana seguinte não se falava em outra coisa na escola: Mané tinha um cachorro tão fantástico que até conseguia andar sobre a água!

Zangado, Pedrinho foi tomar satisfações de Mané:

- Como é que agora o Bóris anda sobre a água quando você mesmo disse que ele era tão inútil que nem sabia nadar?

- É que o Bóris não era o MEU cachorro, mas agora é. - retrucou Mané com um sorriso desdenhoso.

(foto: Charlie, o boxer, por Rick Ehrenberg)

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