25 de out. de 2012

PRA ENTENDER A CRISE FINANCEIRA




Um eminente estatístico observava um concurso para adivinhar o peso de um boi em uma feira rural. Havia 800 participantes e o estatístico sendo o tipo de homem que era, foi inquirindo os paticipantes e anotando os resultados. Descobriu assim que o palpite médio (542,95Kg) ficava muito próximo ao peso real (543,4Kg).

Muitas pessoas não sabem os eventos que se seguiram. Alguns anos mais tarde, a balança parecia tornar-se cada vez menos confiável, e os reparos eram muito caros. Foi quando o organizador da feira teve uma idéia brilhante: já que os participantes eram tão bons em adivinhar o peso de um boi, para que usar a balança? Ele simplesmente pediria a todos que adivinhassem o peso, e tomaria a média das estimativas.

Mas como para toda a solução há um novo problema, logo se descobriu que como a competição tornara-se o centro das atenções, alguns participantes tentavam fraudar o resultado, chegando mesmo a buscar informações privilegiadas do criador do boi. Como tais fatos arriscavam jogar por terra a credibilidade do evento, a comissão organizadora da feira instituiu algumas regras:

1 - Todo o fazendeiro que inscrevesse um boi no concurso deveria preparar três boletins mensais sobre o desenvolvimento do seu boi.

2 - Esses boletins seriam publicados na porta do mercado, e visíveis para todos

3 - Se o agricultor desse a seus amigos qualquer outra informação sobre o animal, esta deveria ser imediatamente afixada na porta do mercado.

4 - A pena por infringir qualquer uma dessas regras seria a expulsão da feira.

5 - Qualquer pessoa que entrasse na competição com o algum conhecimento sobre o boi que não constasse das publicações seria banida da competição.

Analistas profissionais viram ali uma oportunidade. Escrutinaram os conteúdos dessas normas regulatórias e aconselharam os fazendeiros sobre suas implicações. Preocupados, os fazendeiros não pouparam recursos para que tais analistas providenciassem as publicações na forma mais clara e adequada.

Alguns analistas "espertos" repararam ainda que avaliar a nutrição e saúde do boi não era tão importante quanto estudar os palpites dos espectadores, pois se o animal não estava mais sendo pesado, a chave para o sucesso não estava tanto no peso do boi em si, mas no quanto as pessoas imaginavam que ele pesasse. Uns foram ainda mais adiante: o que realmente importava era prever o quanto as pessoas imaginavam que as outras pessoas imaginariam que ele pesasse, e assim por diante.

Ao ouvir essas conversas, um velho fazendeiro argumentou que todo o processo estava se distanciando da realidade que era a criação e engorde de bois. Mas seu protesto foi desconsiderado. Embora todos concordassem que os bois do velho fazendeiro eram gordos e saudáveis e que suas finanças iam de vento em popa, ele não era mais que um velho fazendeiro, criando bois à moda "antiga": o que sabia ele da complexidade dos novos mecanismos do mercado?

Nesse meio tempo, a notícia do novo sistema havia se espalhado por toda a região. Outras cidades queriam adotar os novos padrões. E logo, o mundo todo aderia à moda.

Foram criados organismos internacionais para definir regras para a avaliação do peso do boi. E logo surgiram dois sistemas concorrentes de avaliação: o geralmente aceito princípio de pesagem de bois e o padrão internacional de pesagem de bois. Ambos, no entanto, concordavam num princípio fundamental, que era a necessidade de se eliminar o papel da avaliação subjetiva por qualquer indivíduo.

E assim o peso do boi passou a ser oficialmente definido como sendo a média dos palpites sobre seu peso real.

Um problema é que a quantidade de palpites variava tremendamente: às vezes eram milhares, às vezes muito poucos, e havia ainda casos em que ninguém se arriscava a estimar o peso de um determinado boi.

Matemáticos foram então chamados para resolver esse problema. E criaram modelos a partir dos quais era possível extrapolar os palpites sem a necessidade de se ouvir as pessoas.

Logo, nenhum conhecimento de pecuária era necessário para se arriscar no eletrizante negócio de estimar pesos de bois: bastava um software e um computador com alguma capacidade de processamento.

A essa altura, a criação de bois passara para um plano secundário na economia local. Uma grande indústria se formara incluindo palpiteiros, organizadores de competições paralelas e conselheiros para ajudar as pessoas em seus palpites.

Alguém sugeriu que talvez fosse mais barato simplesmente consertar as balanças, mas foi imediatamente ridicularizado: por que voltar no tempo, usando tão somente um instrumento de precisão e um único juiz, se todos estavam se beneficiando da sabedoria agregada de tanta inteligência?

Nesse meio tempo, um a um os bois foram morrendo no campo, porque com toda essa atividade nem os fazendeiros lembraram de alimentá-los.


(Trecho do livro "The Wisdom of Crowds", James Surowiecki. Versão minha)

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