19 de nov. de 2012

O AMOR E O TEMPO





Era uma vez uma pequena ilha onde viviam os sentimentos.

Um dia Cautela anunciou que como a ilha estava prestes a afundar todos deveriam construir seus botes e partir o quanto antes.

Enquanto os outros sentimentos corriam a providenciar seus botes, Amor, Confiança e Esperança decidiram ficar até o último momento possível.

E, como Cautela advertira, a ilha foi afundando rapidamente. Vendo que não haveria mais tempo para construir seu bote, Amor começou a chamar por socorro, enquanto Confiança e Esperança se divertiam despreocupadas tecendo colares de junco.

Aproxima-se então a Riqueza em seu grande e sólido bote.

- Riqueza, podes me levar contigo?

- Não, não posso. Meu bote está carregado com meus tesouros, não há lugar para vocês três. Consigo levar Confiança, que não pesa muito. - responde Riqueza.

Sem hesitar, Confiança deixa os outros para trás, subindo no bote da Riqueza:

- Vocês vão ficar bem, tenho certeza disso! - exclama com um sorriso.

- Oh, espero que sim! - responde Esperança acenando despreocupada.

Ao fazê-lo, Esperança escorrega da pedra onde se equilibrava e não fosse o abraço forte do Amor, teria se perdido nas águas.

Eis que surge a Inveja remando seu bote, e ao ver o Amor tão fortemente abraçado à Esperança manobra o bote com violência afastando-se dali.

Logo atrás vem a Vaidade, e é a esta que Amor se dirige suplicante:

- Vaidade, por favor, ajude-nos!

- Nem pensar! - exclama vaidade - Molhados como estão vocês vão arruinar meu lindo bote!

Instantes depois, Tristeza se aproximava. Mais uma vez, Amor pediu por socorro:

- Tristeza, leve-nos com você!

- Oh, Amor... fosse só você eu até podia pensar, mas a Esperança só me traz mais infelicidade.

E dizendo isso, seguiu cabisbaixa flutuando sozinha em seu pequeno bote escuro.

Eis que se aproxima Alegria que de tão entretida consigo mesma nem reparou nos dois sentimentos à deriva fortemente abraçados um ao outro.

A noite caía e uma densa neblina se espalhou sobre as ondas encrespadas da maré. Lutando contra o mar agitado, Amor acaba deixando que Esperança lhe escape dos braços. Sozinho na escuridão, começa a chorar lamentando sua má sorte.

Eis que uma voz rouca o chama:

- Venha, Amor, vamos levá-lo.

- Eu perdi Esperança... - lamenta o Amor subindo ao bote.

- Não se preocupe, ela nunca está perdida. - consola outra voz.

Em silêncio, Amor observa as silhuetas encarquilhadas de seus salvadores a remar na quase total escuridão. Exausto, acaba adormecendo.

Um bom tempo depois é despertado pelo baque do bote contra a terra firme.

Em instantes, uma das figuras salta do bote afastando-se rapidamente. Pestanejando, Amor se dirige à velhinha que ficara sentada no bote como a esperar por sua saída para voltar ao mar:

- Desculpe-me, na confusão não perguntei seus nomes...

- Me chamo Sabedoria. - disse a velhinha - E aquele ancião que vai lá longe é o Tempo, meu irmão mais velho.

- O Tempo? - pergunta Amor assombrado - Por que veio em meu socorro, se nunca faz nada por ninguém?

Sabedoria alargou a boca em um largo sorriso de entendimento, então falou:

- Porque só o Tempo é capaz de entender quão valioso é o Amor.

(imagem: "Navio em Mar Tempestuoso",  por Ivan Aivazovsky)

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