2 de nov. de 2012

POR QUE FINADOS?




O Dia dos Mortos, diferente do que entende nossa eufemística contemporaneidade psicoanalisada, não é um dia para se botar flores em túmulos e chorar uma lágrima pelos que se foram purgando nossos próprios sentimentos de culpa pelo não feito quando ainda viviam.

O Dia de Finados não foi criado para acalentarmos a saudade e nos deprimirmos pela falta que sentimos de nossos parentes e amigos que se foram, mas sim para ativa e positivamente intervirmos em seu destino no além-túmulo, projetando luz e energias positivas fortes o suficiente para encontrá-los no limbo da não-consciência que é o purgatório, lembrando-os nem que por um instante, de quem foram em vida e mostrando a eles os frutos das sementes que plantaram.

Se enquanto vivos estamos sujeitos à Misericórdia Divina, ao morrermos temos que lidar com a Justiça Divina. Esses dois princípios sequer se complementam: são excludentes.

A Misericórdia Divina é o que nos permite, EM VIDA, reparar nossos erros, corrigir nossos caminhos e purificar nossas almas. Em vida, podemos mudar, melhorar, evoluir. O Deus da Igreja Católica Apostólica Romana vê, entende e até torce por isso, já que foi sua idéia nos dotar do livre arbítrio, ou a capacidade de obrar pelo bem ou pelo mal. Curta e grosseiramente: enquanto estamos vivos, podemos empurrar com a barriga, enganando-nos com a idéia de que a qualquer momento podemos mudar, melhorar e nos redimir; como o proverbial ladrão arrependido.

Já a Justiça Divina é outra coisa bem diferente. A barganha acaba com a vida: à Justiça Divina cabe a sentença e a execução da pena. Para alguns, é ceu ou inferno, sem escalas.Mas a grande maioria das pessoas não foi em vida nem suficientemente boa para merecer o Paraíso, nem tão má que mereça as chamas do inferno.

Para isso foi criado o Purgatório, um estágio probatório, (ou uma pena alternativa, para usarmos o jargão jurídico).

A questão é que o Purgatório é o limbo da não-consciência, logo, da não-ação. Como pode, portanto, uma pessoa reparar o mal-feito e redimir-se em tal situação? Se não há consciência, se não há a possibilidade de ação, não é possível a transformação.

É aí que entramos nós, os vivos, pois, segundo a Igreja Católica, um dia a cada ano, mais especificamente no Dia de Finados, o Tribunal Divino é aberto para audiência pública, dando ouvidos às preces que fazemos aqui da Terra em favor de nossos falecidos que se acham no purgatório.

Essa é a tradição. E só foi assim instituída, porque as pessoas parecem necessitar de ritos que exerçam pressão social para que pratiquem o bom senso.

Mas muito mais importante que limpar túmulos e enfeitá-los com flores, são os sentimentos de gratidão e o amor legítimo pelo que se foi que fazem a diferença tanto para eles como para nós.

Para mim, todo o dia é dia de finados, e toda a hora é hora de honrar a memória dos que me antecederam com lembranças de ternura, amor e conforto. Acredito com isso estar fazendo menos penoso o seu período de provação.

(Pintura: "O Julgamento Final", Hieronymus Bosch)

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